terça-feira, 30 de março de 2010

Abaixo-assinado em defesa do MNA

É preciso defender o Museu Nacional de Arqueologia!

Para subscrever esta declaração:
http://www.peticao.com.pt/mna

Declaração da Assembleia-Geral da Comissão Nacional Portuguesa do Conselho Internacional de Museus (ICOM)

EM DEFESA DO MUSEU NACIONAL DE ARQUEOLOGIA

Quando há cerca de um ano o anterior Governo colocou a hipótese da transferência do Museu Nacional de Arqueologia (MNA) para a Cordoaria nacional, o seu Grupo de Amigos (GAMNA) chamou logo a atenção para os riscos inerentes, dos quais o mais importante é o da segurança geotécnica do local e do próprio edificado da Cordoaria, para aí se poderem albergar as colecções do Museu Nacional português com colecções mais volumosas e com o maior número de peças classificadas como “tesouros nacionais”.

Após as últimas eleições pareceu ser traçado um caminho que permitia encarar com seriedade esta intenção política. A ministra da Cultura afirmou à imprensa que fora pedido ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) um parecer acerca das referidas condições geotécnicas e que seria feito projecto de arquitectura coerente, respeitador tanto da Cordoaria Nacional como do programa do Museu. Ao mesmo tempo garantiu que esse complexo seria totalmente afecto ao MNA, sem a instalação antecipada de outros serviços no local. Sendo assim, deixaria também de ser necessário alienar espaços do MNA nos Jerónimos, a título de garantia da ocupação antecipada da Cordoaria.

Causa, pois, profunda estranheza a sucessão de acontecimentos das últimas semanas, os quais vão ao ponto de comprometer ou até inviabilizar a continuidade da gestão do Director do Museu, que nos cumpre elogiar pelo dinamismo que lhe conseguiu imprimir e de cujos interesses se constitui, perante todos nós, em legítimo garante.

O estudo tranquilizador que se dizia ter sido pedido ao LNEC, deu afinal lugar a parecer meramente pessoal do técnico convidado para o efeito. O GAMNA, encomendou estudo alternativo, que vai em sentido contrário. O Director do Museu recolheu, ele próprio, outros pareceres, dos mais reputados especialistas da área da engenharia sísmica, que igualmente corroboram e ampliam as preocupações existentes. É agora óbvia a necessidade da realização de um programa de sondagens e de verificações in loco, devidamente controlado por entidade idónea, de modo a poder definir com rigor a situação da Cordoaria em matéria de riscos sísmicos, maremoto, efeito de maré, inundação e infiltração de águas salgadas. A recente tragédia ocorrida na Madeira, onde se perdeu quase por completo o acervo do Museu do Açúcar, devido a inundação, aí está para nos lembrar como não pode haver facilidade e ligeireza neste tipo de decisões.

Enquanto não estiver garantida a segurança geotécnica da instalação do MNA na Cordoaria Nacional e enquanto não forem realizados os adequados estudos de planeamento urbano e circulação viária, importa manter todas as condições de operacionalidade do Museu nos Jerónimos. Neste sentido consideramos incompreensível a alienação pretendida da “torre oca” a curto prazo, até porque uma tal opção iria comprometer definitivamente qualquer hipótese futura de regressar a planos de remodelação e ampliação do MNA nos Jerónimos, conforme foi a opção consistente de sucessivos Governos, até há dois anos. O MNA merece todo o respeito e não pode ser considerado como mero estorvo num local onde aparentemente se quer fazer um novo Museu.

O poder político não pode actuar ignorando os pareceres técnicos qualificados e agindo contra o sentimento de todos os que amam o património e os museus. Apelamos ao bom senso do Governo, afirmando desde já a nossa disposição para apoiar o GAMNA na adopção de todas as medidas cívicas e legais necessárias para que seja defendida, como merece, a instituição mais do que centenária fundada pelo Doutor Leite de Vasconcelos, o antigo “museu do homem português” e actual Museu Nacional de Arqueologia.

Lisboa, em 29 de Março de 2010.

[Declaração e abaixo-assinado adoptado pela Assembleia-Geral da Comissão Nacional Portuguesa do Conselho Internacional dos Museus-ICOM]

Para subscrever esta declaração: http://www.peticao.com.pt/mna

segunda-feira, 29 de março de 2010

MUSEU NACIONAL DE ARQUEOLOGIA: mudar, só para melhor


Esta mensagem não é exactamente sobre Egiptologia, mas reveste-se de grande importância divulgar o comunicado do Director do Museu Nacional de Arqueologia em resposta à febre de expulsão do MNA dos Jerónimos empreendida pelo Ministério da Cultura. Um dos grandes museus de Portugal é claramente colocado em risco por (mais uma!) atitude autista e até irresponsável da pasta agora encabeçada por Gabriela Canavilhas. É preciso dizer não!
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MUSEU NACIONAL DE ARQUEOLOGIA: mudar, só para melhor


Uma vez que foi anunciada a intenção de fazer transitar rapidamente o Museu Nacional de Arqueologia (MNA) para a Cordoaria Nacional (CN), destinando-se o espaço dos Jerónimos à ampliação do Museu de Marinha ou a um novo museu, o Museu da Viagem, julgo já ser altura de dizer o que penso sobre o assunto. A tal me conduzem os deveres que tenho para com os visitantes, o Grupo de Amigos do MNA, as comunidades científicas e museológicas a que pertenço e sobretudo para com a minha própria consciência pessoal. Vejo, aliás, que o tema mobiliza as comunidades da arqueologia, da museologia e do património e começou a interessar os media. Ainda bem, porque o futuro de uma instituição centenária desta natureza é um assunto de cidadania, que ninguém poderia esperar, muito menos desejar, ficasse escondido dentro de gabinetes.

Como tenho repetido noutras ocasiões (v. por exemplo Publico, 23-12-2006), não sou, em absoluto, contra a transferência do MNA para outras instalações. Pertenci a equipas que procuraram essas alternativas e elas chegaram a estar prefiguradas em sucessivos PDMs de Lisboa (Alto do Restelo, Alto da Ajuda, terrenos anexos ao CCB, etc.). Tendo falhado todas estas hipóteses, optei na última década – e com eu todas as direcções do Instituto de tutela - por estudar, primeiro, e depois propor projectos de arquitectura muito sólidos, da autoria de Carlos Guimarães e Luís Soares Carneiro, alicerçados em sondagens e estudos geológicos realizados sob supervisão do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), visando a ampliação do MNA nos espaços já ocupados nos Jerónimos. Estes estudos e projectos foram desde 1998 acolhidos por todos os governos que precederam a actual legislatura e chegaram ser formalmente adoptados por um primeiro-ministro, que anunciou o calendário da sua execução.

Não posso deixar de considerar ser pena que se deitem agora à rua as dezenas, ou porventura centenas, de milhares de euros assim gastos. Mas, enfim, se a opção é de mudança de instalações, então o que importa assegurar é que ela seja claramente para melhor. Não podendo ser para edifício novo, pois que seja para um edifício histórico prestigiado, bem situado e sobretudo adequado às necessidades de um museu moderno, mormente daquele que é um dos mais visitados do Ministério da Cultura, o que possui colecções mais volumosas e vastas e ainda o que tem maior número de bens classificados como “tesouros nacionais”. E já agora, quanto ao espaço deixado livre nos Jerónimos, que se execute nele um projecto cultural que realmente valha a pena e honre a Democracia.

Ora, devo confessar que, não obstante a atitude positiva que sempre tenho em relação à mudança, o espírito construtivo e colaborante a que minha posição funcional me obriga e ainda a esperança que depositei na orientação política traçada pela actual Ministra da Cultura, tenho agora dúvidas que estes desideratos sejam de facto assegurados.

Em Novembro e Dezembro passados, após reuniões tidas com a tutela do MNA e directamente com a senhora Ministra da Cultura, foi traçado um caminho que me pareceu e continua a parecer sério e viável, a saber:

-mandar executar estudos geotécnicos, sob direcção de entidade idónea (que a senhora ministra anunciou à imprensa ser o LNEC), garantidores da viabilidade e condições de instalação do MNA na CN; destes estudos resultariam as obras de engenharia que fossem consideradas como condições prévias a qualquer projecto de arquitectura;

-execução de um projecto da arquitectura arrojado, respeitador da Cordoaria (ela própria classificada como monumento nacional e merecedora de todo o respeito) e do programa museológico do MNA;

-afectação de toda a CN ao MNA, reconfigurado institucionalmente de modo a incluir alguns serviços de arqueologia do Ministério da Cultura que nele poderiam desejavelmente ter lugar;

-não instalação antecipada na CN de serviços do MC, de modo a que o espaço estivesse totalmente disponível para a execução do projecto de arquitectura; correlativamente, não havendo necessidade de ocupação da CN por parte da Cultura, não entrega adiantada à Marinha de espaços nos Jerónimos, mantendo aqui o MNA toda a sua capacidade operacional, até que pudesse ser transferido para a CN, em boa e devida ordem.

Nos últimos dois meses parece que toda esta estratégia foi abandonada, sem que se perceba muito bem porquê. Talvez apenas pelo que se quer fazer nos Jerónimos e não propriamente pelo interesse na melhoria do MNA. Importa recordar que a ideia de afectar o sector oitocentista dos Jerónimos em exclusivo à Marinha, de forma clara (ampliação do Museu de Marinha) ou encapotada (Museu da Viagem, colocado em instalações alienadas para a Marinha, bem diferente do que seria um tal museu antropológico e civilista, sob tutela exclusiva da Cultura), limita-se a ressuscitar o antigo projecto do Estado Novo, sob impulso do almirante Américo Thomaz, que teve golpe de finados quando o Conselho da Revolução, em Janeiro de 1976 (no rescaldo do 25 de Novembro e quando País corria o risco de uma deriva cesarista), entendeu publicar um decreto hoje risível, no qual se impunha a transferência para a Marinha de todos os espaços dos Jerónimos não afectos ao culto. É irónico que este projecto seja retomado agora, mas… é a vida. Na condição em que subscrevo este texto, apenas me cumpre assinalar esta entorse cívica. Todavia, na mesma condição, cumpre-me mais, cumpre-me denunciar a extraordinária situação para que um museu mais do centenário e um acervo tão vasto e estruturante para o País são atirados, tratados como meros empecilhos para que uma opção política de regime possa rapidamente ser executada. Em ditaduras terceiro-mundistas não se faria diferente.

Quanto ao edifico da CN o problema não é tanto político mas técnico e altamente complexo, fazendo todo o sentido os cuidados na sua abordagem, acima sumariados. Trata-se de uma proposta que tem meio século, ressurge ciclicamente e foi sempre recusada com base em pareceres técnicos credíveis. Mudaram entretanto as circunstâncias ? Talvez. Mas apenas se alguém com competência bastante puder agora garantir a inexistência ou o adequado controlo dos riscos sísmicos, de inundação, impacte de marés, etc. que são reconhecidos naquele preciso local (edificado sobre o estuário do rio Seco num local, “Junqueira”, que significa pântanos de juncos) e arriscam conduzir a uma catástrofe para o acervo histórico nacional que o MNA guarda. E se outro alguém garantir depois a mobilização dos meios financeiros suficientes para a profunda requalificação do quarteirão inteiro da CN, onde nalguns sectores se verifica uma quase ruína e noutros as coberturas são em telha vã, os pavimentos são irregulares, estão saturadas em sais marinhos, etc., etc. Ora, a única coisa que até aqui me foi apresentado em sentido tranquilizador, foi um parecer dado a título individual por um antigo técnico LNEC, certamente competente, mas que não responsabiliza mais do o seu autor. O Grupo de Amigos do MNA obteve estudo de outro técnico muito credenciado e que vai em sentido contrário; eu próprio recolhi pareceres de dois dos mais reputados especialistas portugueses em engenharia sísmica – e todos concordam em alertar para o risco efectivo e elevado que existe no local da CN.

Talvez assim se compreenda melhor porque atribuo a esta matéria tanta importância. Talvez se entenda porque não posso em consciência, neste momento, considerar como definitivamente adquirida a transferência do MNA para CN. E, por outro lado, também assim se possa melhor perceber porque considero inaceitável executar desde já o despejo de parte do MNA nos Jerónimos – situação que seria sempre anómala (e desnecessária, porque não existem agora pressões para colocar quaisquer serviços da Cultura na CN), porque o que faria sentido, conforme o acordado inicialmente, era que o Museu apenas desocupasse os espaços actuais quando mudasse de instalações, após as obras profundas de arquitectura a que a CN deverá inevitavelmente ser submetida.

Continuo, pois, a aguardar a apresentação pública de estudos que garantam a segurança do acervo do MNA na CN. Aguardo, logo depois, a abertura de concurso público ou o convite a arquitecto consagrado para desenvolver o projecto que se impõe, tudo isto sem esquecer os estudos urbanísticos da zona envolvente, de modo a precaver, e potenciar, o fluxo das várias centenas de milhar de pessoas que passarão anualmente a frequentar uma zona em que se irão colocar lado a lado os dois mais visitados museus do Ministério da Cultura.

No entretanto, o MNA continuará a servir da melhor forma que puder os seus utilizadores, no cumprimento do programa cívico que Leite de Vasconcelos concebeu e Bernardino Machado adoptou. As iniciativas públicas já tomadas em torno do futuro do MNA, com especial relevo para o espírito combativo demonstrado pelo nosso Grupo de Amigos e para os oferecimentos de activa solidariedade por parte de personalidades as mais diversas, das associações científicas e profissionais, das universidades e das autarquias, reconfortam-me e dão fé de que a sociedade civil não está adormecida.

Luís Raposo

Director do Museu Nacional de Arqueologia, 29 de Março de 2010.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Imagem do Dia: 19-03-2010

Vasos Canópicos de Neskhons, esposa de Pinedjem II. Calcite com cabeças de madeira pintada. Provenientes de Deir el-Bahri, 990-969 a.C.


Autor da fotografia: Captmondo
Data:
19 de Agosto de 2008

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Hieróglifos: recursos online

Para quem tem curiosidade em aprender um pouco mais sobre os hieróglifos egípcios, a página dos Amigos da Egiptologia disponibiliza uma espécie de pequeno curso online em espanhol, organizado por Ángel Sánchez Rodríguez.

Os PDFs podem ser descarregados e lidos comodamente quando mais convier. Como as lições são publicadas de 3 em 3 meses, há tempo para assimilar os conteúdos e resolver vários exercícios. Aqui ficam os conteúdos publicados até agora neste âmbito:



  • Lição n.º 1 - Os signos e a transliteração Descarregar

  • Lição n.º 2 - Nomes próprios: pessoas, deuses e coisas Descarregar

  • Lição n.º 3 - Nomes próprios: Os nomes reais Descarregar

quinta-feira, 18 de março de 2010

Imagem do Dia: 18-03-2010

Um quê de poético e melancólico...



terça-feira, 9 de março de 2010

Dia Internacional da Mulher- A mulher egípcia

Sei bem que foi ontem o Dia da Mulher, no entanto não consegui acabar este artigo a tempo...

Com base num pequeno livro de Christian Jacq (As Egípcias), alguns conteúdos do Dicionário do Antigo Egipto (dir. Luís Manuel de Araújo) e com algumas achas para a fogueira de minha autoria, aqui fica um texto um pouco mais longo que o costume...

Clemente de Alexandria, um dos primeiros padres cristãos, afirma em 180 da nossa era que "em Cristo não há macho nem fêmea". Contrariamente, Tertuliano, que se converteu ao Cristianismo em 193, defende que à mulher "não é permitido falar na igreja, nem ensinar, baptizar, fazer oferendas, reclamar uma parte de uma função masculina ou recitar qualquer ofício sacerdotal". Acaba por ser nesta última linha que as Religiões do Livro irão proceder, condenando as mulheres a um estado de inferioridade espiritual, que mais ou menos camuflado, persiste ainda hoje nas mentalidades eclesiásticas.

Champollion observa, no seu tempo, que no Egipto dos Faraós a mulher ocupava uma posição absolutamente extraordinária em relação à cultura greco-latina clássica mas mesmo também em relação à cultura do século XIX.

Se o grau de emancipação da mulher é a medida do grau de emancipação geral de uma sociedade, atentemos então em alguns exemplos emblemáticos do Antigo Egipto.

1. Ísis, criadora do universo, soberana do céu e das estrelas, senhora da vida, regente das divindades, maga de excelentes conselhos, Sol feminino que tudo marca com o seu selo; os homens vivem às tuas ordens, sem o teu acordo nada se faz.

Verdadeiramente vitoriosa sobre a morte, Ísis é uma deusa cuja popularidade passa as fronteiras do Egipto. Ela sobrevive à extinção da civilização egípcia e o seu culto espalhou-se por toda a bacia do Mediterrâneo. Num tempo em que o homem devia ser o objecto de admiração, o culto a uma mulher continuava forte e resistia às tentativas de aniquilação conduzidas, nomeadamente, pelo Cristianismo. Reza o ditado que "se não podes vencê-los, junta-te a eles". Ísis ganhou novas roupagens e o epíteto de Nossa Senhora, sobre o templo isíaco de Paris (par Isis ou per Isis), nasceu a catedral de Notre Dame.

2. Merit-Neit, Hetep-Heres e Meresanq

Maneton, sacerdote egípcio da época tardia que dividiu as Dinastias reais em 30 (modelo seguido ainda hoje, acrescendo-se a Dinastia Ptolomaica), afirma que as mulheres podiam exercer funções régias. A lei diz: uma mulher pode ser faraó. Se a consagração de algumas confirma isto mesmo, existem ainda outros casos que, apesar de aparentemente não existir consagração oficial, levam-nos a pensar que possam ter exercido o cargo, pelo menos de forma oficiosa.

O facto de Merit-Neit ter o túmulo Y em Abidos e o túmulo 3503 em Saqqara aponta para esta possibilidade, uma vez que, supostamente, só um faraó podia ter este privilégio. Além disso, nas estelas de Merit-Neit não existe a representação do falcão Hórus, protector do Faraó. Esta contradição parece apontar para a ideia de grande importância real, mas sem reconhecimento oficial do cargo.

O caso de Hetep-Heres é desde logo curioso porque a sua câmara funerária foi aberta precisamente a 8 de Março de 1925. O significado do seu nome será "o faraó é plenitude graças a ela". Esposa de Snefru e mãe de Quéops, os seus títulos revelam a importância desta grande dama: mãe do rei do Alto e Baixo Egipto, companheira de Hórus, superiora dos talhantes da Casa da Acácia, para a qual tudo o que ela formula se realiza, filha do deus, do seu corpo, Hetep-Heres.

Meresanq III é um caso notável. Ela possui o título de sacerdotisa do deus Tot, criador da sagrada linguagem hieroglífica. Meresanq tinha acesso à ciência sagrada e aos arquivos dos templos, detendo o conhecimento das escrituras rituais e provando que o universo do conhecimento estava aberto à participação da mulher.

3. Nitócris, a primeira mulher Faraó

Nitócris (Neitikert) é a primeira mulher a ter formalmente o título de "Rei do Alto e do Baixo Egipto" e subiu ao trono em 2184 a.C., reinando dois anos, um mês e um dia segundo os arquivos de época ramessida. Um texto de Eusébio cita Maneton, que se se refere à Faraó da seguinte forma: Uma mulher, Nitócris, reinou; tinha mais coragem do que os homens da sua época e era a mais bela de todas as mulheres, loira e de faces rosadas. Diz-se que construiu uma terceira pirâmide em Gizé.

Nitócris protagonizou uma lenda bem conhecida... enquanto se banhava no Nilo, um falcão apoderou-se de uma das suas sandálias, voou até Mênfis, onde residia o faraó, e deixou-a cair no colo do monarca. Imaginando o delicado pé que as dimensões e requintado objecto faziam adivinhar, mandou procurar a sua proprietária por todo o país. Os emissários do faraó encontraram-na, conduziram-na ao palácio real e foi amor à primeira vista...

4. Hatchepsut

No vigésimo nono dia do segundo mês de Inverno, ano 2 do reinado de Tutmés III, o oráculo do deus Ámon, no grande pátio do templo de Luxor, anuncia a Hatchepsut que ela viria a reinar no futuro.Cinco anos mais tarde ascendeu a Faraó.
Nos baixos-relevos de Deir el-Bahari, Ámon-Rá refere-se a ela nestes termos: Aquela que está unida a Ámon, Hatchepsut, será o nome da filha que depositei no teu corpo... É ela que exercerá as funções de faraó, radiosa e benfazeja, no país inteiro.
O seu reinado terá sido pacífico e muito próspero, com amplo sucesso no campo das obras públicas e das relações comerciais, sendo célebres as suas expedições ao Punt.

5. Nefertiti

O seu nome significa "A Bela chegou". Suma sacerdotisa do culto de Áton, Nefertiti podia dirigir sozinhaos rituais e a apresentação de oferendas ao deus Áton.

Neferiti e Akhenáton parecem governar em pé de igualdade, aparecendo sistematicamente representado o casal régio nas mais diversas cenas religiosas e de Estado. Existe, inclusive, uma pintura mural em que se vê a rainha enquanto faraó a destruir o inimigo, acto tradicionalmente atribuído ao rei.


6. Fora da realeza...

Apesar de nuca ter existido matriarcado, muitas foram as mulheres determinantes na vida pública do Antigo Egipto. Além das já referidas, outros nomes sonantes facilmente vêm à memória: Nefertari, Tiye, Tauseret, Cleópatra VII... A mulher das classes mais elevadas parece, de facto, ter um estatuto fora do comum não só para aquela época, mas mesmo em comparação com os dias de hoje. Ainda assim, as taxas de participação das mulheres de melhor condição social sempre foi mais elevada, quando comparada à restante população... Mas e a comum mulher egípcia?

No Antigo Egipto nenhuma lei obrigava uma mulher a viver com um homem. Uma mulher solteira tinha autonomia jurídica, bens próprios que podia gerir livremente e o casamento não era obrigatório. O pai não tem o direito de impor um pretendente à filha. Aparentemente, também a virgindade à data do casamento não seria questão de honra. Um das maiores curiosidades da altura prende-se com os casamentos experimentais, ou seja, contratos de casamento temporários para aferir se era, de facto, a melhor opção.

O casamento egípcio antigo era a vontade de fundar uma casa (gerep per) ou viver juntos (hensi irem), não se identificando com uma obrigação moral, religiosa ou administrativa. No respeito pela individualidade de cada um, a mulher não adoptava o nome do marido. Existia divórcio (!) e, neste caso, o marido tem que restituir os bens que a mulher levou para o casamento e ainda tem que dar-lhe um terço de tudo o que tenha sido adquirido a partir do dia em que o contrato foi estabelecido.

À excepção do exército, quase todos os sectores económicos que caracterizavam o Egipto Faraónico estavam abertos à participação da mulher. São conhecidos casos de mulheres que assumiram funções como vizires/tchaty, escribas, médicas e cirurgiãs (inclusive médicas-chefe), tesoureiras, funcionárias administrativas, gestoras de negócios, camponesas, chefes-artesãs, pilotos navais, inspectoras, juízas...

A mulher egípcia tem direito a legar bens e a ser herdeira em pé de igualdade com os homens. O caso da dama Naunaqté é extraordinário. Ela decide legar o seu património a quem lhe prestasse assistência na velhice, sem estar à espera de recompensa. Em testamento acaba, desta forma, por deserdar os quatro filhos que não a socorreram, beneficiando três homens e duas mulheres.

Ainda que existissem, com certeza, muitas outras situações em que o estatuto da mulher pudesse não ser o melhor, a verdade é que o Antigo Egipto revelava ser bastante avançado no entendimento que fazia da condição feminina. Pelo menos bem mais do que as civilizações suas contemporâneas, tais como a Babilónia, Assíria e Israel. O direito, assente no princípio teórico da maet (ordem cósmica), não consagrava privilégios de sangue, de classe ou de estatuto económico. A mulher era, neste âmbito, igual ao homem nos direitos fundamentais.

Hoje em dia, com todo o avanço técnico, científico, decorrido tanto tempo histórico, qual será o motivo que leva à perpetuação das desigualdades? Talvez o pequeno enorme pormenor: a desigualdade interessa de facto ao sistema de produção capitalista, como factor de desestabilização e de possibilidade do aumento de lucros. Sim, porque a história atesta que as mulheres são perfeitamente capazes de intervir em qualquer aspecto da vida humana, tal como os homens.

terça-feira, 2 de março de 2010

Mais Lego!

Mais umas fotos do Museu das Crianças, ala do Museu Egípcio do Cairo.


A inauguração contou com a presença do Príncipe Henrik da Dinamarca, do Dr. Zahi Hawass (Secretário-Geral do CSA) e da Dra. Walfaa al-Saddik (Directora-Geral do Museu Egípcio).

Foto de S. Abdel Mohsen



Ora vejam lá se esta esta construção em Lego não está espectacular:

Confesso que sou uma pessoa um pouco suspeita para avaliar porque sou fã de Lego, apesar (...ou por causa?) da minha infância praticamente não ter sido preenchida com estes imaginativos brinquedos...



Agora, 16 modelos que integraram a exposição itinerante da Lego "Segredos dos Faraós" ficaram com uma casinha definitiva neste museu concebido para os mais pequenos, que certamente vai fascinar também muitos adultos.


502 836 blocos de Lego e 2 430 horas depois, os 16 modelos transportam os visitantes numa viagem pelo Antigo Egipto e retratam divindades, artefactos, monumentos e cenas do quotidiano de um país "à beira-Nilo plantado".


Fotos recolhidas da newsletter digital do Museu Egípcio do Cairo